Essa chuva me potencializa uma miscelânea de sensações, como se fosse necessário mais algum estímulo para revelá-las. A verdade é que eu queria estar lá, na praia, esparramada à areia, ou na rua, quando começou a cair - uma adorável surpresa. Há um tempo não experimento a sensação de me banhar na chuva, despreocupadamente, como se sua água lavasse meu âmago, e levasse embora quaisquer resquícios de fatores mundanos, e me deixasse com um interessante vazio, com um quê de curiosidade por um mundo aparentemente novo. Eis a saudade que a chuva me trouxe.
Por qualquer motivo que não me empenhei em decifrar, pus-me à janela. Era interessante enxergar os efeitos repentinos dos pingos nas poças, recém formadas nas calçadas; nos carros; nas pessoas. Era interessante observar tantas vidas que se entrecortam sem mal perceberem, o movimento da cidade, o piscar das luzes, o escorrer das gotas, a vida passar. Tudo isso fazia muito sentido naquele momento, porque era preciso achar sentido em alguma coisa externa - caso contrário, nada mais o faria, visto o turbilhão de insensatezes interiores.
Era a primeira grande injustiça à qual teria de me submeter. Primeira grande conquista. A maior e mais covarde injustiça da minha vida. Primeira de muitas.
Pessoas desprotegidas corriam, na tentativa de escapar do banho, sem êxito. Por que não se deixam logo banhar?
Por que eu não me deixo levar?
Os pingos caíam delicadamente no meu rosto. A chuva fazia sentido. O mundo precisa se molhar. O mundo precisa desaguar.
Os prédios apagavam e reacendiam em suas janelas, pessoas desapareciam e ressurgiam às esquinas, carros iam e vinham, todos iguais, com recheios diferentes.
Eu não vou ser a mesma.
A chuva no meu rosto fazia todo o sentido. Ela vinha de dentro.
Eu precisava desaguar, para entendê-la.
2 comentários:
Comentando só porque é meio injusto um texto tão legal e bem escrito como esse não ter nenhum comentário.
Ai, caramba! Que pessoa fofa! hahahaha brigadaa, mesmo! :)
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