quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Entrecortes

Quando o tempo passa e as chances mudam, os caminhos se desbotam e não se pode mais voltar, o viajante constantemente se vê a pensar.
Que esses entrecortes de estradas nada mais significam que oportunidades. A cada caminho escolhido, há outros diversos relegados ao desvanecer da memória. Aos futuros de pretérito, às especulações e ao esquecimento. 
Quando o tempo passa e as chances mudam e os caminhos se desbotam, o viajante percebe que o problema não é estar onde está no momento, mas ter deixado de estar em outros lugares. A falta não é do que não se tem, mas do que não se fez. Dos passos que não deu, das estradas que não cruzou, da paisagem que não apreciou, das pedras que não retirou, das flores que não colheu e das sementes que não plantou.

O arrependimento jamais será do passo que se deu falho, da pedra que se fez tropeçar, do caminho que se fez encontrar. Estes, o destino lhe guardou. Com estes, aprendeu a superação e adquiriu sabedoria. Estes lhe permitiram ser um homem maior.
Dos sentimentos enforcados, do grito calado, do sonho enfurnado, entretanto, o arrependimento não esquece. 

Nenhum fruto podre, jamais, irá revelar-se mais amargo que a semente que não se plantou. 
Nenhum pesadelo, jamais, atormentará mais que aquele que outrora fora um sonho inconcretizado.

A única saudade que fica é a saudade do que nunca foi, e podia ter sido.


"Say it now, because you never know..."

domingo, 21 de junho de 2015

Tá na moda ser triste?

Quando o usual cumprimento: "como vão as coisas?" é respondido com um "vão ótimas! E para você?", algumas pessoas parecem arregalar olhos como se isso fosse algo extraterrestre.
Ué, mas e o tempo? Não está quente demais? Ou chuvoso demais? Talvez com vento demais, ou instável demais?
E a política? A família? Amores? Estudos? Trabalho? O elevador que demora? Os mendigos da rua? Sapato apertado? Dúvidas da vida?

Bom, para cada uma dessas perguntas temos respostas positivas ou negativas. Para cada problema da vida, há uma lágrima e uma solução.
Podemos escolher em que focar: queremos apenas lágrimas ou também soluções?
Para cada problema da vida que, sim, continuam muitos!, há ainda várias outras alegrias que me mantêm feliz em responder que as coisas estão, obrigada, indo muito bem.
E não preciso me esforçar para responder isso com um sorriso.

Para você que acha que reclamar de tudo é saudável, que filtro preto e branco na vida é o novo colorido e que a felicidade não existe além da imaginação, abra a mente, abra os olhos.
Pare de duvidar um pouco das sutilezas de um sorriso e entenda que elas são mais alcançáveis do que parece. Seja mais leve. Eleve seus pensamentos.

Pra que tanta revolta todo dia? Será que virou moda ser infeliz?

#desabafo

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Desejo primeiro que você ame,

E que amando, também seja amado.
E que se não for, seja breve em esquecer.
E que esquecendo, não guarde mágoa.
Desejo, pois, que não seja assim,
Mas se for, saiba ser sem desesperar.

Desejo também que tenha amigos,
Que mesmo maus e inconseqüentes,
Sejam corajosos e fiéis,
E que pelo menos num deles
Você possa confiar sem duvidar.
E porque a vida é assim,
Desejo ainda que você tenha inimigos.
Nem muitos, nem poucos,
Mas na medida exata para que, algumas vezes,
Você se interpele a respeito
De suas próprias certezas.
E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo,
Para que você não se sinta demasiado seguro.

Desejo depois que você seja útil,
Mas não insubstituível.
E que nos maus momentos,
Quando não restar mais nada,
Essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.

Desejo ainda que você seja tolerante,
Não com os que erram pouco, porque isso é fácil,
Mas com os que erram muito e irremediavelmente,
E que fazendo bom uso dessa tolerância,
Você sirva de exemplo aos outros.

Desejo que você, sendo jovem,
Não amadureça depressa demais,
E que sendo maduro, não insista em rejuvenescer
E que sendo velho, não se dedique ao desespero.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e
É preciso deixar que eles escorram por entre nós.

Desejo por sinal que você seja triste,
Não o ano todo, mas apenas um dia.
Mas que nesse dia descubra
Que o riso diário é bom,
O riso habitual é insosso e o riso constante é insano.

Desejo que você descubra ,
Com o máximo de urgência,
Acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos,
Injustiçados e infelizes, e que estão à sua volta.

Desejo ainda que você afague um gato,
Alimente um cuco e ouça o joão-de-barro
Erguer triunfante o seu canto matinal
Porque, assim, você se sentirá bem por nada.

Desejo também que você plante uma semente,
Por mais minúscula que seja,
E acompanhe o seu crescimento,
Para que você saiba de quantas
Muitas vidas é feita uma árvore.

Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro,
Porque é preciso ser prático.
E que pelo menos uma vez por ano
Coloque um pouco dele
Na sua frente e diga "Isso é meu",
Só para que fique bem claro quem é o dono de quem.

Desejo também que nenhum de seus afetos morra,
Por ele e por você,
Mas que se morrer, você possa chorar
Sem se lamentar e sofrer sem se culpar.

Desejo por fim que você sendo homem,
Tenha uma boa mulher,
E que sendo mulher,
Tenha um bom homem
E que se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes,
E quando estiverem exaustos e sorridentes,
Ainda haja amor para recomeçar.
E se tudo isso acontecer,
Não tenho mais nada a te desejar.


Victor Hugo

 


quinta-feira, 21 de maio de 2015

Girassóis

Eu ganhei uma flor. 
A flor eu sempre quis ganhar: um girassol.
Logo o girassol, que nasce verde de esperança e resplandece amarelo de alegria. Que passa o dia voltado à luz, deixando as sombras para trás.
Mal sabia que ele ainda iria me ensinar tantas coisas.

Dia a dia, olhava maravilhada para essa planta que me conquistara de primeira, regando-a, colocando-a cuidadosamente no lugar mais iluminado da casa.
Até que a sua primeira folha fez-se marrom.
Será que não havia cuidado direito dela? O que deveria ter feito? Por que morreu, assim, logo nos primeiros dias?

Redobrei-me em cuidados, com um quê de remorso pelo desfalecimento de minha pequena primeira planta, até que, em outro dia ensolarado, fez-se a surpresa: notei pequenos carocinhos saindo de seu caule.

Dia e outro passaram, e os carocinhos foram aumentando, outras folhas fizeram-se marrons, e do meio desses carocinhos foram saindo coisinhas amarelas.

A natureza tinha me reservado o lindo espetáculo da renovação. Eu não percebera que não era minha culpa que as folhas morriam. Tampouco que a planta precisava desfazer-se delas para desabrochar novas flores, amarelas como a juventude.

Dediquei-me a prestar mais atenção, a partir de então, no desabrochar dos lindos novos girassóis. Atrevo-me a afirmar que poucas coisas são tão belas quanto uma flor que, tímida, vai colocando pétala por pétala para fora. Do que o botão que, de ponto, vira círculo, sol.

De perto, no despertar de um prematuro, já era possível ver pequenas pétalas amarelas espremidas lá dentro. Passou pela minha cabeça: se já estivessem prontas, por que não sair logo? Se eu lhes forçasse a abertura, iriam mostrar-se?
Mais detalhista, analisei os outros botões que brotavam daquele caule verde e saudável. Era verdade: alguns mais, outros menos desenvolvidos - todos estavam nascendo a seu tempo. Mais do que ontem, menos que amanhã.

Aplaquei meus pensamentos e deixei que a natureza me surpreendesse. Que, sem pressa, seja capaz de esperar para surpreender-me amanhã da beleza que eu jamais seria capaz de forçar naquela linda flor. 
Que eu compreendesse que tudo, desde a vida até a menor flor, tem o seu tempo, e que a paciência era uma das mais venturosas virtudes que nos permite, sempre, a surpresa e a beleza do desabrochar.

Do amanhã, o que será?
Novas folhas marrons, novas pétalas, novos botões? 
Deixe que o dia renove-se sempre em seu esplendoroso surpreender. O resto, o tempo trará, por si só.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

(Des)encontros

Ate mãos como se não houvesse distância,
Beije como se nunca, nada, tivesse dado errado,
Ria como se nunca tivesse chorado,
Abrace como se nunca tivesse que partir,
Ame como se não houvesse amanhã,
Entregue-se como se fosse pra sempre.

Esqueça o que houve e o que não houve,
Vá.
E seja.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Licença poética

A vida é um poema,
E um poema não pode estar errado:
Quem irá dizer que se escreve feio, torto, grande?

Em um poema se expressa o que há de se expressar, de forma, tamanhijeito 
Que for.
Que seja!

Um poema, vez feito, não se muda, se interpreta
Dia de um jeito, dia de outro;
Mesma palavra, infinitas interpretações 

Cada verso lido é a imaginação:
Que para cada um tenha um próprio significado
É a escolha
É a metamorfose,
Iguaizinhos a cada segundo
De cada vida.

Quem irá negar um poema?
Quem irá julgar um poema?
Quem irá definir?
Quem irá dizer?!
O que há de se escrever?