Um vez, quando tinha algo em torno de meus sete anos, estava num canto da sala inventando uma brincadeira, como gostava de fazer.
Minha irmã mais nova e sua babá estavam por perto. Como uma boa caçula em formação, ela gostava de replicar cada passo e gesto que eu fazia, e não tardou pra pedir para entrar na minha brincadeira (um tanto autossuficiente).
Eu, entretanto, não queria que ela entrasse na minha brincadeira. Como uma boa irmã mais velha, não gostava de ser copiada, e estava bastante satisfeita no meu cantinho com distrações imaginárias.
- Não tem como eu te ensinar a minha bincadeira
- Por que não?
- Porque ela não existe
Minha irmã, um tanto inconformada com a minha resposta, foi se lamentar com sua babá: Cibele, a Julia não quer que eu entre na brincadeira dela!
Então Cibele foi me perguntar por que.
- Porque essa brincadeira não existe, não tem como eu ensinar!
Era um tanto de verdade.
- Como que ela não existe? Você não estava brincando?
- É que eu acabei de inventar
- Ué. Mas você já inventou, então. Tudo que não existe só precisa de um bom inventor! Então ela existe agora!
Naquele momento eu fiquei bem revoltada com essa resposta, porque 1) ela tirou meu argumento para não brincar com a minha irmã; 2) se eu inventei a brincadeira eu deveria ter autoridade sobre ela, no sentido de que ensino pra quem eu quiser.
Mas o que eu não sabia era que 14 anos depois esse episódio traçaria todo um novo significado na minha cabeça.
Hoje eu vejo todas as possibilidades e sonhos com uma brincadeira. A gente quer brincar, mas às vezes não tem muita certeza de que isso existe, ou sequer é possível.
Então eu lembro daquela resposta.
Tudo que não existe só está à espera de um bom inventor.
A gente brinca quietinho da nossa brincadeira imaginária, no nosso cantinho, pensando que ela não é tão real ou materializável.
Mas a gente já tá brincando.
A brincadeira já existe: nós já inventamos.
Todos os nossos sonhos, a partir do momento que os criamos, já passaram a existir. Não tem mais volta.
Fomos condenados a ser felizes.
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